Será que o papel é o melhor substituto do plástico? Ou o abate de milhares de árvores tem mais consequências no ambiente do que o uso de couvetes plastificadas? Existirá alguma solução para além destes dois materiais? Bruxelas já implementou algumas regras que restringem o uso do plástico, mas será que estamos a precipitar-nos? O plástico é, de facto, o inimigo número 1 da sociedade? As opiniões dividem-se quanto à melhor opção para o futuro. Elvira Fortunato, vice-reitora da Universidade Nova de Lisboa e diretora do CENIMAT, Centro de Investigação de Materiais daquele estabelecimento de ensino, não tem dúvidas: existem grandes vantagens em substituir plástico por papel. “Trata-se de um material eco-sustentável, totalmente degradável quando exposto ao meio ambiente e é totalmente reciclável. Esta substituição é especialmente relevante no caso dos plásticos mais finos de uso único”, explicou ao i. No entanto, Elvira Fortunato não deixa de salientar que “o plástico foi uma das melhores invenções feitas e grande parte do problema está também relacionado com o comportamento humano”. A especialista diz que não vê preocupação na questão do abate de árvores e na necessidade de plantar mais espécies, como eucaliptos, pois o papel é um material de origem renovável. “A floresta, desde que bem gerida e respeitando as boas práticas de sustentabilidade, é um fator de dinamização económica da sociedade, nomeadamente em zonas onde as alternativas são poucas. Não plantando floresta, os campos ficam abandonados. Por outro lado, existem alternativas ao papel de origem celulósica, o papel de origem bacteriana, como aquele produzido pelas bactérias do vinagre”, explica a especialista. Consciencialização humana é importante Bruxelas aprovou o fim de alguns produtos de plásticos em supermercados até 2021. Além disso, Elvira Fortunato recorda que “a Comissão Europeia, através do Grupo de Conselheiros Científicos, está precisamente neste momento a finalizar uma opinião com um conjunto de recomendações tendo em vista uma melhor utilização dos plásticos”. Para a Associação Portuguesa da Indústria de Plásticos (APIP), “não faz sentido” avançar com restrições “enquanto não for provado que as alternativas ao plástico têm uma pegadaecológica inferior”.Até porque, segundo esta associação portuguesa, “através da realização da análise aos ciclos de vida dos diversos materiais, é sabido que as alternativas comuns de substituição do plástico apresentam maior pegada ecológica e maior impacto nocivo para o ambiente” – dando como referência o estudo da Agência da Proteção Ambiental da Dinamarca e ainda o estudo do Governo do Quebeque, no Canadá. Estes estudos, realizados recentemente, concluem que os sacos de plástico vulgares acabam por deixar uma pegada ecológica bastante menor que outros materiais como é o caso do algodão ou do plástico mais duro. “De facto, o saco de plástico 100% reciclável é a opção mais sustentável porque poderá ser reutilizado e, no seu fim de vida, servir para outros fins”, destaca a APIP, dando o exemplo de o acumular resíduos para posterior reciclagem. A falta de mais estudos sobre os benefícios do plástico é algo que preocupa a APIP, porque “coloca em causa a sustentabilidade ambiental”. “A diabolização e a proibição do material plástico em determinadas aplicações, sem estudos que a suportem, gera uma distorção do mercado e coloca em causa a sustentabilidade ambiental devido à substituição do plástico por materiais tipicamente mais danosos para o meio ambiente”, defende a APIP.A associação destaca ainda que o setor reconhece que existe um problema com o fim dado ao material plástico após o seu uso, “sendo que a forma mais eficaz de resolver não passa definitivamente pela proibição do plástico mas pela mudança de comportamentos”. E é exatamente este um dos pontos essenciais defendidos pela APIP. “Em primeira instância, é fundamental que os produtos de plástico, por via ecodesign, sejam projetados cada vez mais para a reciclagem e para o ambiente, com o propósito de aumentarmos a sua reciclabilidade, sempre com o princípio básico de não comprometermos a sua função”. Mas aqui, a responsabilidade é do consumidor porque, frisa a APIP, de nada adianta haver produtos bem concebidos e fáceis de reciclar se o consumidor não fizer o seu trabalho: adotar os comportamentos de separação e deposição seletivos. Atitude essa que “será decisiva para o desígnio da gestão de resíduos em Portugal”. “Desde logo pelos objetivos futuros a que o país está obrigado em matéria de reciclagem e de deposição em aterro, ambas bastante ambiciosas”. Em resumo, esta associação defende que “todos nós, enquanto consumidores, temos um papel determinante no caminho para a sustentabilidade e economia circular, quer pela a via de um consumo cada vez mais racional, quer pela adoção de um comportamento mais cívico e responsável”. Plástico biológico? E se não existir uma solução perfeita? Carmen Lima, coordenadora do Centro de Informação de Resíduos da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza, diz que o papel não é o melhor substituto do plástico, mas que o verdadeiro problema não está no material: “A ideia é substituir descartáveis por reutilizáveis, não descartáveis por descartáveis. As pessoas têm que mudar a forma de usar os materiais, procurando promover produtos mais duráveis e que não sejam de utilização única. Claro que há exceções: num hospital, o recurso a descartáveis pode ser a solução. O problema destes materiais é o seu destino. Os de papel não são, na maioria, recicláveis ou compostáveis e os de plástico não são encaminhados para a reciclagem. Se abandonados na natureza, os de plástico duram muito tempo e podem ter maior impacte que os de papel”, explicou ao i. Há quem defenda uma outra alternativa: os bioplásticos.
Trata-se de um material derivado de fontes renováveis de biomassa, como gorduras e óleos vegetais, resíduos alimentares ou fibras de madeira. Elvira Fortunato, da CENIMAT, acredita que, apesar dos entraves ainda existentes, esta poderá ser uma solução para o futuro: “Os bioplásticos são uma muito boa alternativa. Um dos grandes desafios neste momento é desenvolver materiais que permitam a sua reciclabilidade. Atualmente, a maior desvantagem é o seu custo, mas acredito que com a evolução normal da ciência e da tecnologia e a sua produção em escala, os custos venham a diminuir, como acontece geralmente com qualquer produto novo”.
Jornal i.